sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

A partida do Brasil - em direção ao Sul

«Estivemos neste abrigo [baía de Santa Lúcia] até à véspera da natividade do Nosso Senhor Jesus Cristo, altura em que, com a armada já pronta para zarpar e a gente muito satisfeita disso, encomendei ao piloto João Carvalho da Concepción o guiamento e o governo das naves até à boca da baía e depois a saída da mesma, vogando o caminho da costa por diante.


E foi aos vinte e sete dias do mês de dezembro, na festividade de São João, que içámos as velas para sulcar o mar pelo rumo oeste-sudoeste, para escapar da moleza e dos grandes calores desta terra, o que sucede por ser verão ali quando é o nosso inverno e ao invés também.»
José Manuel Núñez de la Fuente, Diário de Fernão de Magalhães

A partir da baía de Santa Lúcia ou Luzia, a 26 (ainda) ou a 27 de dezembro de 1519, "foram costeando a costa do Brasil assim como vai pera o sul até o cabo de Santa Maria, que está em trinta e cinco graus daquela banda do sul, sem tomar terra;" (Fernando Oliveira)

Carta da costa do Brasil (século XVI)

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

A armada na Baía de Santa Luzia

Após uma viagem de 11 semanas ininterruptas, a armada entrou na Baía de Santa Luzia, assim denominada na altura, porque no dia 13 de dezembro se celebra o dia dessa santa.

A costa do Brasil já havia sido avistada mais cedo. A a armada aproximou-se do cabo de Santo Agostinho, no nordeste brasileiro, a 29 de novembro - "houveram vista do cabo de Santo Agostinho" -, mas essa era a região mais frequentada pelos navios portugueses e Fernão de Magalhães foi adiando a escala.
No primeiro artigo do contrato de Fernão de Magalhães com o Rei de Espanha, era estabelecido que a armada não poderia aportar em terras portuguesas, pois o Tratado de Tordesilhas proibia essa ação.

A necessidade imperiosa de se abastecerem fez com que procurassem um ponto mais a Sul da costa brasileira, em que houvesse menos hipóteses de ameaça de intervenção portuguesa. «(...) e foi entrar em um rio que se chama Janeiro. Ia por piloto-mor um português chamado João Lopes Carvalhinho [João Carvalho], o qual neste rio já estivera (...)» (Gaspar Correia, Lendas da Índia
Representação cartográfica do território brasileiro,
de Lopo Homem (1519)
«Andávamos sempre à vista da costa, apartados três léguas desta terra que se encontra na demarcação do sereníssimo rei de Portugal, que chamam terra do Brasil por crescer nela uma árvore tintureira desse mesmo nome.

Rumámos para sul em demanda de lançar quanto antes as âncoras, de modo a aliviar o ânimo e melhor fazer provisão de água e vitualhas frescas. (…)

E achámos naquela costa muitas ilhas e rios que desciam dos montes com água abundante e muito limpa. Sendo uma terça-feira, aos treze dias de dezembro do ano presente [1519], mandei virar tudo de poente e entrámos numa grande baía aos 23 graus da parte sul que chamámos de Santa Luzia, por termos chegado no dia desta festividade.

(…)
Com os cinco barcos em bom abrigo, fizemos aprovisionamento naquela paragem de quanto requer uma armada para a sua vitualha, pelo que tomámos água abundantíssima e fresca, peixes e carnes de muita variedade, e ainda frutas e verduras com que carregámos as naus quanto pudemos, sendo os naturais uma gente de condição muito pacífica (…)»
José Manuel Nuñez de la Fuente, Diário de Fernão de Magalhães

Vista aérea da entrada da baía de Santa Lúcia
(hoje designada baía de Guanabara)
Em redor da baía estende-se, na atualidade, a cidade do Rio de Janeiro.



O facto de Magalhães proibir a compra de escravos na costa brasileira e a prática de qualquer ato de violência, fez com que os nativos fossem ganhando confiança e se aproximassem, observando com curiosidade as cerimónias religiosas da tripulação.
Como a chegada da armada coincidiu com a queda ansiada de chuva, os índios imitaram os gestos dos estrangeiros que lhes tinham trazido as chuvas, quando da celebração de uma missa, ajoelhando-se de mãos postas perante a cruz erguida - sinal entendido como o da conversão destas almas.
Atualizado a 12 de janeiro de 2020